quinta-feira, 9 de outubro de 2008

Um almoço de despedida
Por Elaine Oliveira de Brito

Meu nome é Elaine Oliveira de Brito, tenho trinta e três anos e trabalho como voluntária na Escola Municipal Ayrton Senna, no Parque Flora. Resolvi ficar mais perto de meu filho Alan David, que tem sete anos e precisa de uma atenção constante. Trabalhar como voluntária foi a única forma que encontrei para ficar perto dele. Minha presença não modificou seu aprendizado, pois eles sempre foi muito bem estudioso. Deve ter saído ao pai.

Premonição
Há exatamente treze anos, no mês de maio de 1995, resolvemos fazer um belo almoço em homenagem a minha sogra, que estava muito doente, morre, não morre. A idéia partiu de minha cunhada Rose, que disse iria fazer de tudo.

Dona Dione relutou. Muito bonita e vaidosa, minha sogra não se conformava com a decadência física causada pelas seguidas sessões de quimioterapia. Como todos sabem, o tratamento deixa seqüelas irremediáveis. O cabelo cai, a pele perde a maciez, ficando com uma tonalidade própria, um tom embaçado. Um prenúncio da cor da morte.

Minha sogra não queria o almoço de jeito nenhum, mas por dentro desejava o convívio, a presença de seus entes queridos em uma reunião que seria o último encontro com sua turma. No fim, cedeu à pressão da família.

Começou a chegar todo mundo, atendendo ao chamado da Rose, mulher alegre e festeira. Veio um grupo de onze pessoas. A casa ficou cheia. a alegria estava no ar.

Todo o mundo na cozinha
Todo mundo foi pra cozinha para ajudar. A cozinha era pequena, quase uma quitinete. Mal dava para duas pessoas, mas ninguém queria sair. Parecia um trem da Central na hora do rush.

A turma não deixou minha sogra ir para a cozinha, muito embora ela, como toda boa dona de casa, quisesse botar a mão na massa. Ela sempre dizia: “Quem vem em minha casa, tem de provar de meu tempero." Mas, com a doença e os remédios, ela mal conseguia ficar de pé.

Cozinhamos em mutirão, preparando um filé de frango recheado com mussarela, mortadela, presunto, azeitona, acompanhado de feijão, farofa, arroz branco, uma saladinha, tudo feito no maior capricho. Era o prato predileto de dona Dione. Seria um regalo de despedida.

Chegou a hora de servir. Mas em qual mesa, em qual sala? A questão a ser resolvida seria onde botar todo mundo. A sala era muito pequena, pensamos até no banheiro. A solução foi arrastar todo mundo para o quarto de minha sogra, levando uma mesa de armar para colocar os pratos. Afinal, a comida estava esfriando.

Dona Dione não queria que a “moçada” invadisse sua intimidade. Seu quarto, depois de ter ficado sozinha, era um refugio só dela, de sua intimidade, de suas lembranças, de um passado não muito distante, época de sonhos e esperanças que nunca se realizariam.

Um mês depois, minha sogra veio a falecer. O almoço do ano de 95 ficou marcado para sempre. Na época, eu tinha apenas 19 anos. Meu atual marido era apenas um simples namorado. Muito tempo se passou, outros almoços, outras reuniões, outros encontros, alguns desencontros. A família cresceu, alguns partiram, outros chegaram e a vida continua, com momentos plenos de alegria e também com algumas tristezas. A vida é assim e sempre será. Às vezes, não podemos mudá-la.

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